Continuando
a partilhar convosco “Para
onde vai a teoria económica?”.
in
revista EXAME n.o316
de Agosto de 2010; editora IMPRESA Publishing, Lisboa.
“Para
onde vai a teoria económica?”; texto de João
Silvestre e Jorge Nascimento Rodrigues; pp.104-109; Temática:
Economia & Conjuntura.
(...)
George Akerlof, Nobel da Economia
em 2001 juntamente com Michael Spence
e Joseph Stiglitz, também esteve
em Cambridge para chamar a
atenção para o papel que a hipótese de eficiência dos mercados
teve na crise financeira. O economista americano lembrou que, quando
todos os agentes seguem a hipótese de os activos estarem no valor
justo e, de repente, os preços se afastam, todo o mercado fica em
risco.
Akerlof
lembrou os famosos "animal spirits" de Keynes sobre
os quais escreveu no ano passado um livro com Robert
Shiller e a forma como podem levar as cotações para longe do
seu nível eficiente. Estes "animal spirits" que
muitas vezes comprometem a irracionalidade dos agentes económicos,
são compostos por três partes: confiança
(a euforia e o desespero alternam-se por vezes com grande
velocidade); óleo de
serpente (certos activos parecem por vezes muito mais valiosos
do que realmente são); a narrativa
(ideias sem fundamento, mas que vingam entre os investidores).
O
pressuposto da racionalidade é, de longe, o mais polémico de toda a
teoria económica e tem merecido fortes críticas. Desde logo com a
entrada na contenda de economistas não-tradicionais vindos da
psicologia e que mostram como o ser humano pode ser tão irracional
em tantas das suas decisões. São os caso, por exemplo, de Kahneman
(Nobel em 2002) ou de Dan Ariely
do Massachussets
Institute of Technology, autor do best-seller
Previsivelmente Irracional.
Só
que a racionalidade é ótima para os mercados financeiros porque
lhes dá uma aparente maior capacidade de previsão e para os modelos
matemáticos que se tornam muito mais facilmente manobráveis. Por
isso, expectativas racionais e
mercados eficientes andaram de
mãos dadas ao longo de muitos anos. Em termos mais técnicos, o
preço dos activos segue um chamado passeio aleatório, ou
seja, cada valor é o anterior acrescido de uma variação aleatória
e incapaz de ser prevista dada a informação disponível no momento
anterior. O matemático e Nobel da Economia em 1994, John
Nash, a "Mente Brilhante"
interpretada no cinema por Russel Crowe, numa passagem recente por
Lisboa para uma conferência sobre Investigação
Operacional, lembrava precisamente a incapacidade de se
prever perfeitamente o futuro em economia.
Eugene
Fama tem sido apontado repetidamente como um dos vilões da
crise pela sua teoria. Robert Lucas
saiu em sua defesa num artigo publicado na revista The
Economist em Agosto do ano passado, em que considera que,
se os economistas tivessem modelos capazes de prever as crises como a
atual, seriam do conhecimento geral e, nesse caso, era informação
utilizada no preço dos activos como defende a hipótese dos mercados
eficientes. Lucas diz o mesmo, num misto de ironia com pensamento
económico, que se existissem banqueiros centrais capazes de
identificar e esvaziar as bolhas "não
haveria dinheiro para lhes pagar".
Markus
Brunnermeier, da Universidade
de Princeton nos Estados Unidos que também esteve em
Cambridge e tem trabalhado precisamente na inclusão de variáveis
financeiras nos modelos macroeconómicos, respondeu então a
Lucas defendendo uma maior atenção ao sistema financeiro nos
modelos standard que servem de base às decisões de política
económica e lembrando que "a
maior parte da investigação em macroeconomia simplesmente assume
que as perturbações financeiras não existem".
Em
declarações ao Expresso
em Setembro do ano passado, Eugene Fama confessou não se ter dado
conta que a sua hipótese tinha tomado conta do mundo dos
investimentos, mas insistiu que "se
os bancos e os bancos de investimento tomassem a eficiência dos
mercados mais seriamente, talvez tivessem evitado muitos dos seus
recentes problemas".
O
ecossistema teórico da racionalidade
teve os seus detractores no mundo académico desde finais do anos
1970, um deles foi quase apagado dos anais da disciplina económica.
Chama-se Hyman Minsky, um autor
americano, nativo de Chicago
que é provavelmente desconhecido da maioria dos leitores com
formação económica ou prática nos negócios e que faleceu aos 77
anos, em 1996, sem ver a comprovação prática do que disse durante
duas décadas.
"Minsky
foi influente nalguns homens de negócios e nalguns decisores
políticos, mas foi repudiado ou menorizado pela literatura económica
dominante porque ele colocava o dedo na ferida do edifício dos
modelos macroeconómicos" – diz-nos Domenico
Delli Gatti, professor de economia na Universidade
Católica de Milão. Minsky dizia que o problema da
instabilidade financeira estava inscrito no ADN do capitalismo.
"A
sua análise estava baseada numa compreensão ecológica das práticas
financeiras" – refere-nos Rajiv
Sethi, professor de economia no Barnard
College, na Universidade de Columbia, em Nova Iorque. "Era
o que ele queria expressar com o paradoxo de que a
estabilidade era em si desestabilizadora.
No período de estabilidade económica, estratégias agressivas
baseadas em alavancagem financeira muito elevada, eram altamente
lucrativas e, por isso, proliferavam à custa de
estratégias mais
conservadoras. O que funcionava até que uma crise chegasse."
- diz Sethi.
Este
comportamento colectivo de "manada" é provocado por um
mecanismo imbuído no sistema – a
pressão competitiva – que leva sectores inteiros como o
financeiro, por exemplo, e mesmo largas faixas da economia real a
comportarem-se "adoptando
as expectativas mais optimistas do vizinho do lado que adota um
comportamento de alto risco" – prossegue Sethi.
Minsky
voltou novamente a ser ofuscado pela rápida ascensão política do
keynesianismo contemporâneo que julgou chegada a janela de
oportunidade para se vingar de quase trinta anos de jejum teórico.
O
célebre manifesto, em jeito de artigo de opinião no The
New York Times de Paul
Krugman, em Setembro de 2009, partia a louça contra as
teorias da Escola de Chicago e capitalizava na vaga de intervenções
monetárias e de política
orçamental keynesiana que os países desenvolvidos e
alguns emergentes adoptaram para conter o pânico financeiro e travar
a recessão.
A
parte final da cauda desta Grande Recessão trouxe uma inesperada
prenda – o irromper da crise da
dívida soberana. As correntes contrárias ao
keynesianismo rapidamente reganharam fôlego e hoje voltámos aos
debates fracturantes sobre consolidação orçamental ou
manutenção dos estímulos antirrecessivos de iniciativa
governamental sobre política monetária acomodatícia ou corte
com a manipulação das taxas de juro a níveis muito baixos
pelos bancos centrais (à excepção de casos como a Austrália ou o
Canadá).
A
popularidade de Keynes está novamente a cair e a fase de gastar para
evitar uma nova grande depressão deu lugar a uma fase de cortar
os défices a fundo. Principalmente nos países mais afectados
pela crise da dívida soberana como Espanha, Grécia ou Portugal, mas
também noutras economias. O economista italiano Alberto
Alesina, de Harvard,
tem estudado as chamadas consolidações orçamentais expansionistas.
Alesina fez as contas e concluiu que, num conjunto de 107
consolidações em 20 países, 26 foram expansionistas. Só
que são, na maior parte dos casos, acompanhadas de outras medidas
como redução de juros ou desvalorizações cambiais que, para
os países da zona euro, não podem ser adoptadas.
A
escola de doutrina económica conhecida por "austríaca"
– pelo facto de os seus fundadores no início do século XX serem
oriundos do antigo império austro-húngaro e particularmente dos
círculos intelectuais vienenses – procura jogar agora a sua
cartada atacando o intervencionismo público e o vício pela
expansão de crédito e recordando Ludwig
von Mises e Friedrich Hayek,
os seus dois vultos maiores.
Contudo,
Joseph Stiglitz, Nobel, numa
conferência no King's College, em Cambridge,
Reino Unido, afirmou que "a
crise foi um grande local de teste de teorias alternativas. O modelo
standard foi considerado deficiente, mas também muitos outros
modelos o foram." daí o apelo para um debate
plural. Mark Thoma acha que a
palavra de ordem deste momento de reflexão deve ser o de fomentar
a diversidade metodológica. Jean-Phillipe
Bouchaud, um econofísico francês, é abertamente por esta
opção "que diversas
escolas floresçam." Luigi
Spaventa, professor na Universidade
de Roma, disse-nos numa ocasião "a
diversidade deve sempre florescer na pesquisa, particularmente nas
ciências sociais. A ambição de um grande modelo universal deverá
ser provavelmente abandonada. O sacrifício da elegância será
premiado por maior relevância".
Vários
especialistas têm defendido que o caminho é tornar os modelos mais
ajustados à realidade. Modelos simples são indispensáveis para
compreender mecanismos básicos, mas devem ser aperfeiçoados para
contemplar realidades que, nalguns casos, estão completamente
arredadas como a existência de crises, falências no sistema
financeiro ou simplesmente a possibilidade de os mercados não
funcionarem.
Assim
a opção pela diversidade tem permitido a afirmação de uma nova
corrente na macroeconomia que quer trazer para esta disciplina os
benefícios das metodologias e ferramentas que atualmente usam as
ciências duras.
J.
Doyne Farmer, professor no Instituto de Santa
Fé, no Estado americano do Novo México, e um dos
fundadores da teoria do caos e da
complexidade e Duncan Foley
do departamento de Economia da New
School for Social Research de Nova Iorque escreveram no
ano passado um artigo de opinião na revista científica Nature
apelando para que os economistas e as equipas governamentais e dos
bancos centrais larguem os modelos falhados e algum amadorismo e
utilizem plenamente a ciência.
"É
incrível como a economia não tem nenhum projecto como o CERN, o do
Genoma Humano ou o de Modelização Climática. Eu acho que o
problema não é keynesianismo versus eficiência de mercado em si,
mas antes um problema de fundo na cultura intelectual na disciplina
da economia, o seu atraso em abraçar plenamente o método científico
tal como é praticado noutras disciplinas" –
referiu-nos Doyne Farmer que acaba
de lançar uma carta aberta sugerindo que a futura agência Office
of Financial Research dê um empurrão decisivo a este
tipo de investigação no sentido de arreigar uma nova postura e uma
nova prática em novas gerações de economistas.
Delli
Gatti disse-nos a concluir: "É
hoje manifesto que os modelos macroeconómicos e financeiros ainda em
uso e que estão disponíveis para as autoridades governamentais e
monetárias são inapropriados para lidar com o risco sistémico,
algo que foi subestimado na literatura e na prática. Não concordo
com a opinião de que os economistas devem desistir dos modelos
analíticos. Que devem deixar o campo para os sociólogos, os
psicólogos e os historiadores económicos e possivelmente
desaparecer de cena. Os modelos de agentes heterogéneos de base
computacional estão disponíveis e podem ser precisamente usados
para explorar virtualmente a emergência de euforias e derrocadas
movidas por esse famoso animal
spirits".
Especulador
húngaro criou instituto para repensar a teoria económica
"O
estudo da economia foi manipulado pelo mercado", "o
papel da matemática tornou-se a linguagem dominante",
"a economia (como
disciplina) deixou de reflectir o mundo real" – eis
três motivos que levaram o financeiro George
Soros a juntar 25 economistas num brainstorming em
Setembro de 2009, nos Estados Unidos.
Da
reflexão nasceu, em Outubro, o Institute
for New Economic Thinking (INET) com um financiamento de
Soros e que fica sediado em Nova Iorque. O objectivo é suscitar "a
emergência de novos paradigmas" a partir de "uma
discussão aberta" e "incorporando
pensamento de outras áreas". O alvo a mobilizar é
"a nova geração de
economistas".
A
primeira grande iniciativa foi uma conferência no simbólico King's
College, em Cambridge, no Reino Unido, entre 8 e 11 de
Abril deste ano (2010). O título falava claramente dos propósitos
da discussão: "A crise económica
e a crise da teoria económica". Reuniu mais de cinco
dezenas de conferencistas entre eles vários Prémios Nobel e
Dominique Strauss-Khan, presidente
do Fundo Monetário Internacional.
Joseph
Stiglitz, um dos Nobel envolvidos na iniciativa, disse nesta
conferência: "O
paradigma standard
falhou não só na previsão da crise, mas também para fornecer
ideias para o desenho de uma regulação que torne uma recorrência
menos provável." E acrescentou: "A
crise foi um grande local de teste de teorias alternativas. O modelo
standard
foi considerado deficiente, mas também muitos outros modelos o
foram." Fez apelo para que a "agenda
para a reforma da teoria económica se baseie num debate plural".
Robert
Skidelsky, o lorde inglês biógrafo oficial de Keynes,
um dos participantes da conferência e membro do INET,
em jeito de reportagem no seu blogue, referiu que, em Cambridge,
estiveram, em Abril, três correntes: os neokeynesianos
como Stiglitz e Mark Brunnermeier; os pós-keynesianos
e que ele inclui o próprio Soros com a sua teoria
da reflexibilidade e os economistas
comportamentalistas como George Akerlof.
Especialistas
do caos querem o Office
of Financial Research
a
repensar a economia
É
uma das 13 novas agências a criar ao abrigo da proposta de lei sobre
a reforma de Wall Street e de protecção
do consumidor (mais conhecida por lei
Dodd-Frank, do nome dos seus principais proponentes, o senador
Chris Dodd, presidente da Comissão
Bancária do Senado, e o deputado Barney
Frank, presidente do Comité de Serviços Financeiros da
Câmara dos Representantes) que acabou por passar na Câmara de
Representantes do Congresso norte-americano no final de Junho por uma
folgada maioria. Falta agora ser aprovada pelo Senado, um combate que
estava renhido entre democratas e republicanos e depois promulgada
pelo Presidente Obama.
A
nova agência pretende ser um repositório do registo de todas as
transacções financeiras e dedica-se à análise estatística e à
investigação para monitorizar o risco sistémico. J.
Doyne Farmer, um dos expoentes do Santa
Fé Institute, e um dos pais da teoria
da complexidade e do caos advoga que esta nova agência pode
ser o local de investigação ideal para levar a disciplina da
economia a uma reflexão nova "abraçando
os mesmos métodos que são usados no resto da ciência".
Numa
carta aberta intitulada "A
oportunidade de Obama mudar na essência a economia",
Doyne Farmer advoga que tal agência "não
deve ser uma cópia institucional quer do Departamento do Tesouro
quer da Reserva Federal". Apela a que haja
"diversidade",
acusando que a equipa económica de Obama é basicamente formada por
gente da corrente dominante. "Criar
uma nova cultura intelectual é algo que pode mudar na essência a
disciplina da economia e no longo prazo poderá ser, de longe, o
impacto mais profundo e mais duradouro desta reforma financeira."
- conclui.
O meu Clube de Leitura
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